segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

o que esconde um John Phillips of London e uma gravata Cerruti



Olham para nós de alto a baixo, somos sempre os primeiros a entrar, sentamos sempre nos melhores lugares, comemos o melhor da ementa dentro das opções que existem.
Continumos a ser observados, muitos queriam estar naquele lugar onde eu estou.
Somos avaliados, até na maneira como lemos o Washington Post , o jornal diário estrangeiro disponivel só para os lugares business .
Mas, há sempre um mas nas nossas histórias e eu não deixo passar uma oportunidade para quem pensa que a nossa vida é feita de azul e de sonhos dos mais bonitos.
Sim de facto temos estas beneces, entre outras que não interessa, porque não interessa mesmo, mas de igual modo eu gostava que todos soubessem das histórias de alguns  executivos. As nossas...
Eu sou um executivo na maior financeira/consultora do mundo, ganho o suficiente para as minhas despesas, não sou rico, nem sequer vou aspirar riqueza.
Dentro de pouco tempo vou estar desempregado outra vez, vou deixar os fatos caros, os automóveis de luxo, dos chauffeurs que me abrem a porta para sair do automóvel, de cumprimentar gente muito poderosa neste mundo, ou do conforto exagerado dos hotéis de 5 estrelas.
Largamos tudo, uma família, aquilo que nos pertence, o nosso sangue, deixamos uma aldeiola que ninguém  sabe onde é.  Ninguém sabe que eu sei pegar numa enchada, que consigo fazer um batatal ou podar uma àrvore em Janeiro...entre outras tantas coisas.
As situações são como são, eis -me aqui agora neste papel, sei lá eu o que fiz ontem, e ontem eu já me esqueci.
Se estamos aqui, é porque precisamos, todos sem excepção, fomos avaliados e estamos a cumprir com as nossas obrigações profissionais. É o nosso ganha pão, é esta a nossa vida, sem sentimentos de culpa ou arrependimentos.
A nossa vida por vezes não é assim tão feliz. Entretanto vamos descobrindo durante os nossos almoços, um pouco de cada um de nós, um intelectual que sabe fazer lavores, ou outro que foi jogador profissional de futebol e ainda um outro que foi mineiro. Hoje somos o que somos...assim, simplesmente.
Olham para nós assim de alto-a-baixo, pensam que a nossa vida é ostentação, luxo, vida fácil, mas não é...
Entretanto mais uma viagem, e depois outra, e a ultima será o meu regresso a casa para as minhas primeiras e bem merecidas férias.
Assim simplesmente...

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

só mais um bocadinho...

Correria louca, desde o levantar, concertar o cabelo que mais parece ter saído de uma batalha campal.
Dar um toque ao marido, porque também ele tem de ir para o trabalho.
Ela vai para a casa de banho preparar-se como toda digna mulher, o que ela faz lá dentro , isso não nos interessa...e há coisa mais bela do que ser mulher.
Todo o tempo do universo será sempre da mulher...é ilimitado.
Foi acordar os miudos que tem escola às 8:00, vestiu-os, arranjou de jeito o nó torto da gravata do seu homem, seja ele quem for, uma pessoa importante ou não.
Ela foi buscar o pão à padaria, ainda nós estamos a dormir, para que bem fresquinho possamos saborear o mais precioso alimento e para que possamos, assim, ter um bom começo de dia.
Vestiu os putos ensonados, que nem habilidade tem para vestir um simples par de meias. Calçar os ténis de marca. Estamos prontos.
O pequeno almoço mais parece um restaurante, porque toda gente tem preferências, uns querem nesquick, outros café porque não gostam de chocolate. Uns querem pão com fiambre porque não gostam de manteiga, porque engorda. O mais velho quer Nestum porque não quer comer pão de manhã.
Saímos todos depressa porque o pai está atrasado, prepara-se para as filas de transito da cidade. Entramos todos no carro, e ela ainda não chegou, o que fará ela ainda em casa e nós tão atrasados.
Ela está atrasada como sempre, é sempre assim...porque é que ela se levanta tão cedo, questionamos todos.
- Não é Pai?!
- É o costume, já sabes como são as mulheres...todas iguais!
Ela entra no carro e ouve das boas de todos, olha para tràs e sorri para os seus filhos lindos, e para o nó de gravata perfeito do seu marido.
O carro começa a andar, ela abre a sua mala, tira o seu baton vermelho, dá um retoque, e mais outro.
Aproveita para dar um toque de rimel e está perfeita
Eu habituei-me a ver isto todos os dias, eramos uns chatos, incluindo o meu pai, esquecemos que por detràs de uma família está sempre um capitão de equipa que se chama , mãe.
- Deixa-me estar na cama mais um bocadinho...!
- Só mais um boicadinho então, vou levantar o teu irmão.

sábado, 21 de janeiro de 2017

adoro as tuas curvas...

Penso que foi na primavera, sim, foi, o Sol estava alto e fazia calor, sim sem duvida.
Eu peguei no carro e fui por aí a cima, e quando eu digo por aí acima, quero dizer no sentido centro Este.
Eu e a minha mania do IC8, provavelmente é um dos sítios de Portugal com mais diversidade, em tudo, na paisagem, nas pessoas, na "perspectiva" na sua globalidade.
Além disso, se eu me arrepender durante o trajecto, se quiser mudar de destino tenho sempre a antiga nacional 2, aquela que ligava Chaves a Lisboa nos anos 60, sim nós também temos uma famous Route 66 , mas como costumo dizer, muita coisa passa ao lado de um Portugal muito esquecido, corrupto, acabado...É pena, e é com muita satisfação que vejo alguns jovens que decidem abandonar os cânones tradicionais (de ter um emprego) e recuperar de alguma forma o que já parecia perdido. A Joana M com os seus doces de mirtilio na zona de Sever, quinta Vermelha do amigo José Rocha, e das deliciosas compotas de frutos "Apanhados do Chão" da Ana Rita S.
Estas são algumas propostas entre tantas, boas ideias, de gente boa, com um objectivo. O pior de tudo é o bicho papão chamado Estado que na (sua) maioria das vezes destrói um sonho. Impostos para cá, e para lá entre outras situações que agora não interessam para este texto.
Tenho passado as minhas noites nisto, são sitios fantásticos, ideias maravilhosas, lugares lindíssimos de um Portugal demasiado fechado em si mesmo, apertado para se salvar e para alimentar os abutres que continuam muito ávidos de comer aquilo que resta. E assim não vamos lá e a emigração é a unica alternativa, porque há bocas para alimentar, para cuidar, etc, etc, etc.
Os meus caminhos não são e nunca serão as auto-estradas do meu país - o meu dinheiro não é para usurpadores, prefiro as velhinhas nacionais, tenha eu um chaveco reles ou um Porsche.
Tenho muitas fotos dos meus passeios, dos lugares, das vilas bonitas que temos.
Eu sou suspeito, quem tiver possibilidade de fazer este circuito muito "cansativo" durante um fim de semana não o dará como perdido. Chegar bem cedo a Oleiros e tomar o pequeno almoço composto por duas belas  torradas de pão de centeio e meia de leite de cabra sem açucar no largo da vila, é fantástico para quem gosta de sabores fortes. Depois seguir no sentido Este pela velhinha estrada nacional 238 em direcção ao Fundão. Parar para almoçar um fantástico cabrito no forno no restaurante " O Alambique", e quem for guloso provar o queijo de ovelha - algo fantástico.
O Fundão não é uma vila bonita, mas tem como pano de fundo a Serra da Estrela que dá um toque de charme à vila.
Sugiro, na minha opinião, continuar a nossa viagem até Penamacor, aproveitar este tempo para visitar a "Vila do Madeiro" , esta sim é uma vila pequenina muito bonita, assente numa colina, casas em pedra granito, tem um Castelo muito interessante para quem gosta de fotografia - Espanha mesmo ali! As pessoas são encantadoras sabem receber bem, falam pelos cotovelos, e eu que sou um gajo fechado fico contagiado com tanta abertura. Continuemos a nossa viagem até ao destino final, até aquela que é para mim a mais linda aldeia de Portugal - Monsanto. Por curiosidade, esta aldeia chegou ater 3500 habitantes, hoje tem menos de 600 habitantes.
Alojamento, eu preferiro o  solar "Chafariz Mono" próximo da antiga casa onde nasceu Fernando Namora.
De regresso a casa, opto pelas curvas do nosso terreno, Escalos de Baixo, Castelo Branco, Retaxo e paragem obrigatória para um ultimo café em Vila Velha de Rodão, e aproveitar para olhar para o Tejo, de uma forma, mais sereno, mais largo em margens, mais limpo...é bom ficar aqui 5 minutos! é mesmo, é o tempo de um café! e nada é perdido.
Continuo a nossa viagem por terras de Proença a Velha - Lindo!!!, Sertã- Fantástica,Cernache do BomJardim - Pensativa, Dornes- (eu era feliz aqui) , Cabaços - Os anos 40 perfeitos, Alvaiazere - o descanso do guerreiro, Abiul - a taurada mais antiga de Portugal...
Portugal, adoro as tuas curvas...até breve, muito em breve.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

por caminhos tortos, mas sapientes

A tarde ia caindo devagarinho, lenta, como só as tardes de verão conseguem fazer.
O caminho era estreito, mas dava para caminhar lado a lado, como nós gostávamos de fazer, caminhar e falar.
Eram assuntos sérios, outros menos importantes, alguns banais outros sem jeito nenhum, daqueles para te tirar uma gargalhada como só tu sabias soltar.
Nunca houve um único "tema" tabu entre nós, dissertávamos sobre o que nos vinha à cabeça e a ocasião fazia o resto. Não tínhamos hora, ou local, as coisas aconteciam simplesmente, aqui ou ali, não interessava.
Um dia, daqueles de primavera, calor, fomos fazer um passeio de carro, subimos a colina, e foi ali mesmo no parque da igreja. Fomos tal como os outros iam, namorar, aquele era o sitio ideal. Fomos nós também.
Preparámos-nos para algo mais envolvente entre namorados, e começamos a falar, e nós falávamos, de tudo. Inclinámos os nossos bancos, o ambiente era propício ao romance e a algo mais.
Isso nunca aconteceu, falamos de Deus, quem era, onde estava, se valia a pena, e falámos...
Regressamos aos nossos destinos, não fomos para falar de Deus mas para intensamente viver um pouco da nossa juventude.
Preenchemos um espaço vazio que faltava às nossas conversas, duradouras no tempo, que a terra um dia há de por fim.
Os temas foram sempre diversos, saíam sem fazer sentido por vezes, eram assuntos de coisas, retalhos de contos, anedotas também...textos, longos, de métrica simples, mas plenos de tudo.
Percorremos o que deviamos percorrer, compreendemos, sorrimos, abraçamos, fizemos amor, discutimos, fizeste-me de mim um homem, daqueles a sério, ontem percebi isso,todos os dias percebo isso, essa é a tua essência... foi e tem sido curioso.
Nunca compreendi o teu plano, quando dei por mim a meio do livro, eu já estava só, percebi depois.
Senti a dor da tua ausência, penitenciei-me como os escribas do egipto antigo quando revelavam uma verdade proibida por lei. O sol nasceu hoje, tal como ontem e assim o fará amanhã. O vento vai continuar a soprar, devagar ora mais forte, mas sempre vai existir o vento, o sol, e os nossos caminhos, as nossas conversas. É tudo um caminho, uma vida...Mas desta vez eu vou dar o meu passeio sózinho, se vou sentir a tua falta, sim, fazes sempre, de dia, de tarde e à noite, até que o sono vença o pensamento, e aí deixas de existir. Nesse momento eu tenho paz.
- Há quanto tempo não beijas uma mulher ? Perguntaste-me.
- A ultima vez foi contigo, por isso já faz algum tempo... Respondi.
Continuámos, tu com as tuas perguntas de algibeira e eu obrigado a responder, porque sim , porque tu queres saber sempre tudo, e eu, tenho que te responder, senão nem o Diabo te atura.
Mas eu gosto...
Estava a ler uns excertos do Torga , agora entendo o senhor Doutor Adolfo Rocha, entendo as suas angustias humanas, o esquivar da vida, as suas fugas para São Martinho de Anta, eu estou quase como ele, tudo é mais claro.
- Vamos ao Chinês?! Perguntas-me. Eu respondo logo no instante.
- Nem é tarde nem é cedo...é mesmo agora!










segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

um homem sem nome no Campo Mártires da Pátria

Um dia fui a Lisboa, não em passeio, tive de ir, assuntos meus...infelizmente, andei nisto durante 2 anos, caminhei sozinho sem dizer nada a ninguém. Há coisas que ninguém deve saber, são assuntos que vão connosco para baixo da terra.
Ainda faltava tempo, eu geralmente gosto de ir cedo para este tipo de coisas. Mesmo assim, encontrar um lugar para estacionar o veículo alugado torna-se complicado.
Andei no Torel, e nada, junto à biblioteca da Fundação D. Pedro também nada, nem um misero lugar, não me restou outra alternativa senão pagar por dia de parque para Emel.
Parqueei o carro por baixo da rotunda do Martim Moniz.
O meu assunto era às 10 da manhã, estava abafado, como só em Lisboa...nunca percebi bem porquê.
Cada parque custa quase 8 € por dia, mas naquela situação teve mesmo que ser. Quando eu colocava uma nota de 20 € na máquina um moribundo vestido com roupas sujas e rotas aborda-me por uns "tostões" segundo o seu pedido. Como a máquina não dá notas, só moedas, aquilo mais parecia uma slot machine de um casino qualquer. Os olhos do homem eram tão escuros que metiam medo, não sei quanto lhe dei, o homem agradeceu dizendo que era para comprar comida para a familia. Disse : fico-lhe eternamente grato!
Eu queria lá saber de gratidão, eu queria era sair dali o mais rapidamente possivel.
Saí e fui em direcção ao local para o qual tinha vindo. Odeio aqueles sitios...
Andava chateado com aquilo e com a vida, sem esperança nenhuma, já andava cansado de andar abaixo e acima...era um desgaste tremendo.
Era 3 da tarde quando saí, não me apeteceu almoçar, eu queria sair era o mais rapidamente daquela cidade. Quando cheguei junto ao meu automóvel emprestado pela Avis reparei que o "pedinte" ainda lá estava. Ele olhou para mim, sorridente e disse:
- Estive aqui o tempo todo, não deixei que tocassem no seu carro.
Eu achei tão estranho aquilo, acho que nem agradeci ao homem pela façanha, estava tão chateado...quem é que com juízo perfeito ficaria ali aquele tempo todo, ainda por cima cheio de humidade e ao frio a guardar um automóvel, que nem era meu. Por um punhado de moedas...
Durante a viagem para cima ocorreu-me uma série de coisas, laivos de pensamentos, retalhos da minha vida, cenas...Pensei ainda no homem, do "guardador" do meu automóvel alugado e nos seus olhos escuros como a escuridão da noite, daquele fétido cheiro corporal.
Novembro,  recebi o resultado e a conclusão final daquela "visita" a Lisboa, foi um bom momento...depois de ler o que dizia aquela carta.
Foi um alívio pensar que já não era preciso voltar a Lisboa...nunca mais!

quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

tão natural como nascer


O último abraço de António Lobo Antunes ao irmão João

Não  precisávamos de falar. Como ele dizia
– Tu sabes sempre o que eu estou a pensar e eu sei sempre o que tu estás a pensar
mas muito pouco tempo antes de morrer veio ter comigo e passámos a tarde juntos, sentados lado a lado no sofá. Foi ele quem falou quase sempre, eu pouco abri a boca.
Mostrou-me os braços, o corpo
– Estou miserável
sabia que ia morrer dali a nada e comportou-se com a extraordinária coragem do costume. Coragem, dignidade e pudor. A certa altura
– Para onde queres ir quando morreres?
respondi
– Para os Jerónimos, naturalmente.
Ficou uns minutos calado e depois
– Tu acreditas na eternidade.
Disse-lhe
– Tu também.
Novo silêncio.
– Eu quero ser cremado e que ponham as cinzas na serra, voltado para a Praia das Maçãs.
Novo silêncio. A seguir
– Vou morrer primeiro que tu. Vou morrer agora.
Mais silêncio. Eu
– Ganhei-te outra vez.
ele
– É.
Ele
Ganhamos sempre os dois.
Eu
– Porque é que a gente gosta tanto um do outro?
Ele silêncio antes de
– Se me voltas a falar de amor vou-me embora.
eu
– Sabes onde é a porta.
Mas não voltámos a falar de amor. Para quê? Estava ali todo. Depois quis ver os livros
– Para aí vinte mil, não?
eu
– Mais ou menos, incluindo os muitos que encontrei numa livraria de segunda mão, assinados por ti.
Silêncio. Eu
– Não podia suportar a ideia de que outras pessoas tivessem em casa os livros do meu irmão.
Gesto vago. Depois ele
– António
e silêncio, depois eu
– João
e silêncio. Ou seja um diálogo de amor compridíssimo. Depois
– Se os pais cá estivessem
e esta frase fez-me compreender melhor a sua imensa dor. A mãe para quem a inteligência, num homem, era a forma suprema de sensualidade. E um rabo grande a coisa mais feia deste mundo. Um homem inteligente, na sua opinião, era atraentíssimo.
– Um homem bonito e estúpido ao fim de um quarto de hora não existe
e ainda bem porque, assim, talvez tenhamos algumas chances com ela. A mãe, ainda
– Desafio qualquer mulher no mundo a ter filhos tão inteligentes como os meus.
E ele continuou a falar:
– Depois eu fui para Nova Iorque e tu para África.
Numa altura, depois de África, em que ele estava a sofrer muito meti-me num avião e fui para casa dele. Durante o dia ele trabalhava no hospital e eu ficava às voltas com o Fado Alexandrino. Depois jantávamos juntos e comíamos uns gelados enormes que ele trazia a vermos os play-offs do basquete.
Um de nós
– E jogam com humor
o que é tão raro no desporto. Aos sábados um bocado numa discoteca. Camisas cheias de baton. A certa altura olhou, do sofá, para a estante mais próxima: Um livro de Marcel Pagnol. Ele
– A nossa infância toda.
E eu com vontade de tocar-lhe. Claro que não toquei. As suas mãos, que conhecia tão bem, poisadas nos joelhos. Embora impassíveis estávamos demasiado emocionados.
Ele
– De qualquer modo não nos perdemos um ao outro
eu, depois de um silêncio compridíssimo
– Nunca nos perdemos, não é agora que isso vai acontecer.
Ele
– Vou chamar um taxi.
Silêncio.
Ele
– Acompanhas-me lá abaixo?
Entre a casa e a rua uma distância grande. Era o fim do dia, já não estava muito sol. O taxi à espera no passeio. O chofer, a quem ele operara a mãe, veio abrir-lhe a porta do carro. Ele voltou-se para mim e disse o meu nome. Eu aproximei-me dele e disse o seu. Abraçámo-nos com muita força e, de repente, começou a chorar. Só sentia ossos nas minhas mãos. Mas nada de mariquices, claro, sobretudo nada de mariquices.
Ele
– Não digas a ninguém que chorei.
E sentou-se no banco ao lado do chofer, sem olhar para mim. Não olhámos um para o outro, aliás, mas nunca nos vimos tão bem. O carro foi-se embora. Fiquei na borda do passeio até que desapareceu. E então, de mãos nos bolsos, voltei para casa. Nunca houve um abraço assim no mundo.


domingo, 8 de janeiro de 2017

gosto de esquecer...às vezes faz-me bem




Já revisitei mais o meu passado que agora. Os tempos são outros, são mais anos, e isso pesa.
Há coisas que eu não esqueço, por mais que eu peça a Deus, para, que lá de cima ele atire uma marreta de pedreiro bem pesada na minha cabeça...para definitivamente esquecer certas coisas.
Se as coisas estão lá é porque tem algum significado para continuarem a chagar-me quase, quase todos os dias.
Eu já não sou fácil, estou duro de coração, não sou tolerante a certas coisas, irrito-me com facilidade...eu era tão calmo e pacífico que por vezes até irritava.
Agora estou menos vulnerável, mais pragmático, estou duro de roer...só entra quem eu quiser!!!
O meu passeio de hoje à tarde com um frio de rachar aos -12º não me incomodaram nada, às vezes faz bem, alivia a tensão, a dor de qualquer coisa...e tudo passa por momentos, então, aí eu sou livre de tudo, sou mais eu, sorrio a quem passa, um estrangeiro que ainda só sabe dizer poucas palavras.
Tudo é mais fácil, tudo flui com menos rigor ao que estou habituado.
Começo habituar à ideia de que a minha vida vai ser isto, hoje aqui, amanhã noutro lado, não há volta a dar.
Gosto de esquecer quem sou por breves e finitos momentos...às vezes faz-me bem.
São 19: 54 de Domingo, e faz um frio de rachar...

dito assim 2


quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

dito assim...em Milão.



Eu considero-me um homem moderno, vivido, experienciado, enfim...foi a vida que me fez desta maneira e não de outra.
Ouvi isto, ontem, num bar aqui perto do Hotel onde estou instalado. Lindo por sinal...
O tema é sobre o Swing , e é abordado por dois ingleses, pelo menos falavam inglês.
Segundo um, tinha sido espectacular! a sua mulher estava encantada, e já falava em fazer de novo...e ele também. O outro homem falava da sua experiência swinguer no sul de França, e de fazer férias de Verão naquela zona só para fazer Swing.
Confesso,  e estranhamente penso, que algo me falha aqui  algures no meu processamento cognitivo...como sou curioso e ávido de saber sempre mais fui dar uma vista de olhos à wikipédia , pelo meu telemóvel, mesmo ali onde bebia o meu distinto e saboroso Lavazza. 
A informação e o significado que se dá a este acto é o seguinte : Swing ou troca de casais, é um relacionamento sexual entre dois casais estáveis que praticam sexo grupal como uma atividade recreativa ou social(...)
Não li mais, bastou-me aquele paragrafo...
Percebi que estou a salvo desta coisa de trocas de casais, uma vez que para ser swinger o casal deve ser estável!? bolas...!!! já me safei desta!!! não sou casado e não estou estável!!! se estivesse?!
E a segunda, e segundo a nossa Wikipédia é uma actividade recreativa e ou social!!! lembro-me de andar num rancho folclórico e isso era considerado uma actividade recreativa e social...!!! agora não, é tira daqui e mete dacolá!!! ora enfias aqui para depois enfiares acolá!!!
Estas coisa fazem-me confusão e as pessoas acham normal...sim é natural!!! olha toma lá a minha mulher e diverte-te na boa, e eu fico com a tua...pode ser na minha casa.
Fico confuso, a minha vida, a minha terra por vezes não é esta...tudo acontece!!! Serei eu que estou errado?! será mesmo assim...como é?!
Fiquei por ali, esvaziei a cabeça daquela conversa, estava de costas e eles nem me viram...
Por vezes penso nas minhas filhas, que futuro lhes reserva, como irão ver o mundo.
Subi para o quarto e fui dormir.