sexta-feira, 12 de maio de 2017

a tesoura da modista

Chegou a Portugal há 8 anos,originária dos fiordes, fez a viagem na sua carrinha Volkswagen muito velhinha, sobejamente conhecida por  pão de forma.
Fugiu porque o momento assim o destinou, era chegada a sua hora, sem motivos, disse a toda a gente que iria partir, mudar de vida, mudar de ares.
Olhou para o mapa Europeu, e olhou para o céu cinzento que (sempre) a acompanhou durante a sua vida e disse para si mesma: vou para onde está o Sol, e onde o céu é azul.
Partiu, com viveres para algumas semanas, sem projetos, sem intenção de qualquer morada, mas partiu - essa era a sua intenção.
Cansada da viagem,  e já em terras lusas, parou numa estação de serviço e enquanto bebia uma garrafa de água folheou um jornal colocado no balcão, sebento de tanto folheado por mãos dos clientes.
Olhou para uma série de fotografias da página central, eram fotos de uma serra e um rio situados próximos de uma aldeia da Beira Baixa, para os lados da Serra da Malcata.
Porto Novo, é o nome dessa aldeia.
Falou com algumas pessoas, precisava de saber a direção até aquele lugar, per si mágico, segundo os seus sentidos.
Profundamente envelhecida, a aldeia quase jaz, só existem pessoas idosas, estradas tortas, muros velhos feitos de pedra, casas abandonadas, tudo muito pouco "civilizado" comparativamente com as suas origens.
Ficou por ali, porque foi ali que algo chamou a sua atenção, a beleza natural, a cor da natureza, o silencio e os uivos do vento vindos da serra.
Foi estranho para os "naturais" a chegada de uma estrangeira, de cabelos ruivos, alta e de olhos azuis.
Por ali ficou, fez amizades com os velhinhos da aldeia...e passaram dois, três, quatro e outros tantos anos. Faz aventais, pulseiras, faz arranjos de roupa, cose roupa...Chamam-lhe a "modista". Foi uma brisa de ar fresco, segundo os residentes, estas gentes precisam de companhia, de carinho, com quem falar.
Muitos vão ao seu espaço só para falar, simplesmente falar, de tudo, do tempo se for preciso. Estas pessoas tem necessidade disso. Existe um velhinho que entra na loja, diz boa tarde e senta-se numa cadeira de vime, faz a sua sesta, e quando acorda despede-se da "modista" e vai para casa.
Esta estrangeira é o "ai Jesus" desta gente, acompanha os mais debilitados ao médico, à farmácia, nas compras do mês.
Existem caminhos tortos que se transformam em auto-estradas e vice versa, mas se existe um caminho, esse, é sempre bom de explorar, nunca se sabe...



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